terça-feira, 26 de abril de 2011

Gótico Historico & Medieval

Escultura Gótica

A humanização do céu


A escultura gótica surge, numa primeira fase, intimamente associada à arquitetura das catedrais. No exterior do edifício são sobretudo as fachadas, principal e do transepto, nomeadamente os portais, os suportes para a implantação da escultura; à medida que se vão tornando mais complexas, também as empenas, rosáceas, tabernáculos dos arcobotantes e gárgulas das catedrais vão servir de suporte para a decoração das esculturas. Quanto à estrutura do portal, ele é constituído pelo tímpano, arquivoltas, mainel e ombreiras ou jambas, substituídas por estátuas-coluna. No interior o trabalho é bem mais reduzido, e é sobretudo a partir do século XIV que a catedral passa a albergar mobiliário com relevo em talha (cadeirais do coro), estatuária devocional, altares e arcas tumulares. No seu conjunto, a escultura gótica pode ser agrupada em quatro tipologias. Sendo a primeira as estátuas-coluna, aplicada nas ombreiras do portal conferindo uma dimensão vertical ao pórtico, mas que progressivamente se vai autonomi- zando em relação ao seu suporte arquitetônico. O segundo elemento é o relevo escultórico, sobretudo no tímpano do portal. O terceiro, considera-se a escultura de vulto redondo, em especial estatuária de devoção, resultante da evolução das estátuas-coluna. O quarto item da tipologia é a escultura funerária, ou seja, arcas tumulares e estátuas jacentes.
Os temas mais comuns, sobretudo na fachada (portal), são os seguintes: Cristo em Majestade, associado ao Tetramorfo; Juízo Final; Virgem em Majestade, Vida da Virgem e Nascimento de Cristo - um tema introduzido por influência da difusão do culto mariano desde os finais do século XII - Episódios da vida dos santos patronos da respectiva igreja - associados a estes temas começa a ser mais comum a existência de relevos escultóricos e estatuária de caráter profano. Se a estátua-coluna e o relevo têm uma relação de dependência com o respectivo suporte arquitetônico, a partir do século XIV torna-se muito abundante a escultura de vulto redondo, estatuária de devoção associada às práticas da piedade individual e destinada a capelas ou oratórios privados. É sobretudo constituída por imagens da Virgem (Virgem com o Menino, Senhora do Ó ou Santas Mães, Pietà), de santos e crucifixos, e executada em materiais diversos, como a pedra, madeira, marfim, bronze, ouro e alabastro. Em termos de linguagem plástica, e no conjunto de toda a produção escultórica, podem ser definidas três tendências principais: Idealismo (séculos XII-XIII), com figuras estilizadas e ausência de expressividade dos respectivos rostos (serenidade inexpressiva); hieratismo das estátuas-coluna: ausência de movimento, panejamentos rígidos acentuam a verticalidade, ausência de proporção anatômica; Naturalismo (2ª metade do século XIII a meados do XIV), em que a estatuária ganha vida e movimento, com ancas pronunciadas e silhuetas "em S" para evidenciar dinamismo, acentua-se a expressão do rosto e surgem detalhes mais minuciosos no tratamento de cabelos e barbas, conferindo um caráter mais humano às personagens divinas representadas; Realismo (2ª metade do século XIV e durante o século XV), época do triunfo da curva e contra-curva, ondulação excessiva, sobretudo no drapeamento, que acentua a expressividade das estátuas; preocupação absoluta de representação do real, que conduz à procura da verossimilhança no retrato; por influência da grande mortandade após 1348 e os progressos nos estudos anatômicos levam mesmo ao exagero de representar o corpo feito cadáver.


Sobre a escultura gótica

Apesar de terem mantido muitos aspectos que caracterizaram a escultura românica, como, por exemplo, a continuidade de uma relação de grande cumplicidade com a arquitetura, os artistas dos sécs. XIII e XIV alargaram o seu repertório temático, utilizaram um maior número de suportes e receberam da parte dos enco- mendadores uma atitude mais aberta em relação ao seu trabalho. Relativamente ao período anterior, registrou-se uma evolução, sobretudo, ao nível da composição, da expressividade, da monumentalidade das suas obras e da progres- siva aproximação ao real. Deste modo, a escultura gótica estabeleceu uma aproximação gradual à cultura humanística, assumindo um caráter mais naturalista na representação do rosto, do corpo humano ou da natureza, desenvolvendo novas capacidades expressivas e autonomizando-se em relação à arquitetura. Tendo conquistado o seu próprio espaço, a escultura atingiu uma concepção mais plástica, mais dinâmica e verdadeira. Uma das obras paradigmáticas desta renovação é a Morte da Virgem, do tímpano da Catedral de Estrasburgo. Aqui, a dificuldade de adaptação das figuras ao espaço arquitetônico, implicando em alguns casos a representação parcial das figuras, é compensada pela delicadeza com que os Apóstolos tocam o corpo da Virgem e pela emoção que se manifesta nos seus rostos. Também a forma como são tratados os cabelos e as pregas das roupas, evidenciando a anatomia dos corpos, é inovadora e faz-nos lembrar a arte clássica. Já a Anunciação e a Visitação esculpidas nas jambas do pórtico ocidental da Catedral de Reims libertaram-se da arquitetura para se converterem em esculturas de vulto redondo, firmemente apoiadas no solo, continuando um caminho iniciado em Chartres. Privilegiando uma aproximação ao mundo físico, as pregas da roupa deixam transparecer as anatomias que cobrem e, especialmente na Visitação, o escultor parece dominar completamente o modelo clássico.
Talvez a inovação mais significativa se relacione com a organização do portal do templo: as ombreiras, ou jambas, são substituídas por estátuas-coluna que se prolongam nas arquivoltas em torno do tímpano. A evolução dos temas e da iconografia, inspirada no Novo Testamento, continua sendo estabelecida por motivações de ordem religiosa - Cristo em Majestade, Juízo Final (com os Apóstolos distribuídos pelas ombreiras) e a Virgem em Majestade -, mas, de um modo geral, as figuras são humanizadas estabelecendo entre elas uma relação afetiva. A partir de meados do séc. XII, o santo patrono da igreja ocupa o tímpano numa mandorla e no centro de cenas da sua vida, ao qual se juntam todos os santos da diocese nas ombreiras, em estátuas-coluna. A escultura gótica caracterizou-se, sobretudo, pelo naturalismo das expressões e dos detalhes mais minuciosos e por uma representação mais próxima do real. Para além destas manifestações, surgem com grande impacto na produção escultórica as estátuas jacentes e os retratos funerários, o que se deveu fundamentalmente à proliferação de capelas privadas para albergar sepulcros de nobres, altos dignitários eclesiásticos e burgueses.

Texto original de "História da Cultura e das Artes" - Paulo Simões Nunes
Extraído e adaptado de http://galaaz.blogspot.com

Arquitetura Gótica


Na arquitetura, o estilo gótico é caracterizado pelo arco de ogiva. Este estilo surgiu na França nos fins do século XII e expandiu-se pela Europa Ocidental, mantendo-se até a Renascença, ou seja, até o século XIV, na Itália, e até o século XVI ao norte dos Alpes. Moore definiu a arquitetura gótica como um "sistema de abóbadas, cuja estabilidade era assegurada por um equilíbrio perfeito de forças". Esta interessante definição é infelizmente incompleta, pois nem sequer cita os arcos de ogiva. Mas a verdade é que, se este elemento é fundamen- tal no estilo gótico, aparece também noutros estilos, assim como o arco de volta inteira surge igualmente nos edifícios góticos. Durante o período românico, o arco de ogiva apare- ce principalmente nos lugares onde existe forte influência sarracena. Os arquitetos da catedral românica de Monreale, utilizaram-no freqüentemente. O românico espanhol, e até mesmo o provençal, empregaram o arco de ogiva. Por outro lado, num edifício tão gótico quanto a catedral de Chartres, as janelas da clarabóia da nave são de volta inteira, salvo nas suas subdivisões, assim como os arcos diagonais da Notre-Dame de Paris. O arco de ogiva, então, não é tão característico do gótico como geralmente se pensa.
A definição de Moore não menciona as paredes, mas somente os três elementos principais da construção. No gótico francês, uma vez chegado o seu máximo esplendor, a parede deixou de ser com efeito, elemento da estrutura. O edifício é uma gaiola de vidro e de pedra com as janelas que vão de um pilar a outro. Se a parede existe ainda, por exemplo, sob as janelas das naves laterais, é somente como defesa contra as intempéries. Tudo se passa como se as paredes românicas tivessem sido cortadas em secções e cada secção houvesse girado sobre si própria num ângulo reto para o exterior, de modo a formar contra-fortes.
No seu início o gótico francês baseava-se nos elementos estruturais definidos por Moore, porém essa definição só se aplicaria à elaboração do gótico francês não abrangendo a arquitetura gótica de outros países ou as fases ulteriores deste estilo na França.


A abóbada

Dentre os elementos da arquitetura gótica este seria o mais importante. Os arquitetos góticos introduziram duas inovações fundamentais na construção de abóbadas. Em primeiro lugar para os arcos dobrados e os arcos dianteiros terem a mesma dimensão que os arcos cruzeiros, adotaram o arco de ogiva. O cruzamento das ogivas permite obter abóbadas com arcos da mesma altura. Numa abóbada que cubra um espaço retangular, a ogiva dos arcos formeiros tem de ser muito pronunciada. Por outro lado, os construtores góticos tentaram concentrar a pressão das abóbadas ao longo de uma linha única, em frente de cada pilar, no exterior do edifício. Os arcos góticos alteiam os arcos formeiros: em vez de os iniciar ao mesmo nível que os arcos diagonais, inserem um colunelo que permite colocar o nascimento dos arcos formeiros em nível superior ao dos outros. Assim, as janelas da clarabóia tornam-se mais importantes e, desse modo, não há mais a necessidade de ser acentuar a ogiva do arco formeiro para obter uma abóbada de flechas iguais. Finalmente, a zona coberta pela abóbada na parede exterior reduz-se a uma linha em vez de se limitar a um triângulo. A nave da Catedral de Amiens oferece um exemplo claro deste sistema.


Suporte

Uma vez que a arquitetura gótica se desenvolveu a partir da românica, podemos encontrar um colunelo para cada nervura da abóbada, o que efetivamente acontece sobre os capitéis da arcada da nave. Como as proporções do edifício se tornaram mais leves, os fustes são mais esguios do que na arte românica e sublinham o movimento ascendente do conjunto. Quanto ao pilar propriamente dito, o caso é diferente. O pilar composto românico, por mais lógico que seja, é relativamente espesso; define o espaço da nave central e a separa das laterais. As diferentes partes da igreja são desde então concebidas como unidades separadas. O gótico parece primeiramente retroceder. O pilar composto é substituído por uma coluna lisa e redonda cuja massa, menos volumosa, facilita a passagem entre a nave central e as laterais, criando um espaço único. Para que se torne possível utilizar colunas lisas, os suportes aparentes dos arcos da abóbada devem terminar ao nível dos capitéis, o que embora seja arquitetonicamente possível, é pouco estético. Com efeito, as verticais rígidas dos colunelos parecem interromper-se muito bruscamente.
Entretanto, o desejo de se construir catedrais cada vez mais altas, leva a um grande aprimoramento técnico. Exemplo disso são os fortíssimos pilares de Chartres, nos elegantes fustes de Amiens, testemunho de uma experiência mais avançada em termos de arquitetura.
A habilidade técnica em constante progresso dos construtores dos séculos XIV e XV, permitiu recorrer novamente ao pilar composto, cujos elementos serão tão finos e tão delicados, que parece desafiar as leis da gravidade.


Contraforte

É o terceiro e último elemento estrutural do gótico. As paredes góticas ao contrário das românicas são finas ou inexistentes, sendo o contraforte tipicamente gótico composto de duas partes. A primeira, o contraforte propriamente dito, inspira-se no contraforte românico e está colocado em ângulo reto em relação a igreja, contra a parede lateral, e, eleva-se muito altamente, num enorme grau de perfeição. O peso deste elemento neutraliza a pressão das abóbadas. O segundo elemento, ou arcobotante, é especificamente gótico. O arcobotante tem uma caixilharia diagonal de pedra; está escorado de um lado pelo contraforte, colocado a certa distância da parede, e por outro lado pela clarabóia da nave. O arcobotante dirige a pressão da abóbada para o exterior por cima da cobertura da nave central. Como é cimbrado por baixo, exerce um pouco de pressão sobre o vão; sozinho não poderia resistir à pressão lateral das abóbadas, mas associado aos contrafortes, tem uma força enorme.
Foi graças a esse elemento que o gótico ousou construir naves tão altas e tão claras. Assim, a catedral gótica eleva-se para o céu como uma oração e, tal como a filosofia medieval, exprime o intangível e transcende o homem, na sua procura do além.

Texto original de Beatrix Algrave
Extraído e adaptado de www.beatrix.pro.br

Filosofia e Escultura na Idade Média

A arte da escultura atingiu um de seus ápices na Idade Média. Até o século X, essa arte foi pouco praticada. Quando, porém, se começou a praticá-la, logo se conseguiu um progresso muito rápido. Em pouco tempo os escultores adquiriram uma grande técnica, tornando-se capazes de realizar obras de arte de nível tão elevado que poucas vezes foi igualado na História.
Na arte gótica distinguem-se três grandes períodos ou fases:
  • Gótico Primitivo, no século XII;
  • Gótico Radiante, no século XIII;
  • Gótico Flamejante, nos séculos XIII e XIV.
É bem sabido que todo estilo artístico tem profunda relação com a filosofia de seu tempo. Pode-se definir um estilo como a expressão de uma filosofia por meio de símbolos. Sendo assim, as fases do estilo Gótico exprimem por meio de seus símbolos a filosofia aceita em seu tempo. Então, a escultura Gótica Primitiva deve exprimir os conceitos da filosofia platônica e neo-platônica em vigor, em seu tempo. A escultura do Gótico Radiante exprime as idéias do aristotélico-tomismo, enquanto a escultura Gótica Flamejante retrata a filosofia nominalista de Ockham.
Tomemos um ponto característico desses diversos sistemas filosóficos – a questão dos univer- sais – e vejamos como ela se refletiu na escultura desses períodos. A questão dos universais atormentou os filósofos desde a Grécia antiga.
Chamam-se universais os termos que designam todos os seres de determinada espécie. Assim, o termo boi designa todos os bois que possam existir, qualquer que seja sua raça e características. A questão é: o universal existe? Como existe? Onde? Para resolvê-la, três soluções principais foram aventadas: a do platonismo, a do aristotélico-tomismo e a do nominalismo de Guilherme de Ockham.
A solução platônica afirmava que o universal existe realmente no mundo das idéias. Existiriam, em um mundo ideal, desprovidas totalmente de matéria, as puras idéias. Lá existiriam o boi ideal, a rosa ideal, o homem ideal, etc. Esse mundo das idéias, segundo Platão, seria um mundo puramente espiritual, perfeito e divino. É a solução denominada realista, porque considera o universal realmente existente. Essa posição conduz rapidamente à gnose, porque é negadora da bondade da matéria.
Oposta a ela, per diametrum, é a solução proposta por Ockham. Segundo esse filósofo franciscano e fraticello, o universal seria apenas um nome, sem nenhuma existência, de qualquer forma que seja. Daí sua filosofia chamar-se nominalismo. Para Ockham só existiria o indivíduo, e o conhecimento como a ciência seriam apenas dos seres singulares. Em conseqüência, o conhecimento só poderia ser experimental e nunca teórico. Sendo a matéria a causa da individuação, o nominalismo de Ockham devia necessariamente conduzir a humanidade para o experimentalismo, para o existencialismo e para o materialismo modernos, isto é, para várias formas de panteísmo. Pois nele se dá uma divinização da matéria, com desprezo ou negação do espírito, da forma substancial e da essência.
Para resolver a questão dos universais, o aristotélico-tomismo deu uma solução que se situa a meio caminho entre o realismo do platonismo e o nominalismo de Ockham. Segundo São Tomás, o universal existe na mente humana, enquanto idéia, e nos seres concretos, enquanto forma substancial. E seria isso exatamente o que nos permite reconhecer os seres como indivíduos de uma espécie. Na solução tomista não se despreza nem o espírito, nem a matéria; nem a forma, nem a matéria; nem a alma, nem o corpo. Essas três soluções do problema dos universais foram sucessivamente adotadas no decorrer da Idade Média, causando conseqüências nas características da escultura de cada período.


A escultura Gótica Primitiva e o Realismo platônico

O estilo gótico foi criado no século XII. A primeira obra de arquitetura gótica foi a realizada por Suger ao reformar a fachada e o coro da Abadia de Saint-Denis. Entretanto, as primeiras esculturas em estilo gótico vão ser encontradas na Catedral de Chartres.
Na época em que se esculpiram as grandes estátuas de Chartres, os mestres das universidades medievais adotavam a filosofia platônica, e portanto admitiam a solução realista no problema dos universais. Daí os escultores darem inteira primazia aos valores universais, desprezando tudo o que era próprio do indivíduo. Por isso, não se esculpiam retratos nesse tempo. Fazia-se a imagem do Rei, do Bispo, do Cavaleiro, etc. Esculpiam-se modelos ideais, jamais pessoas concretas. O realismo platônico desprezava a matéria; por isso os escultores do gótico primitivo davam pouquíssima importância aos corpos de suas estátuas. O que valia era a alma, expressa particularmente no rosto.
O mundo ideal de Platão, sendo inteiramente espiritual, não admitia nem sentimentos, nem emoções. Por isso, a estatuária dessa época era absolutamente fria, não revelando emoção nenhuma. São rostos que não riem nem choram. Fisionomias absolutamente impassíveis. Nelas há uma tal ausência de sentimentos e movimentos que elas puderam ser feitas como estátuas-colunas, como se vêem tantas nos portais de Chartres. Também não se dava importância a que os corpos das estátuas fossem desproporcionados às cabeças. Muitas das estátuas da Catedral de Chartres apresentam uma relação anormal entre corpo e cabeça. Sabe-se que essa proporção, normalmente, deve ser de 1 para 7 ou 8; no máximo de 1 para 9. Nas estátuas de Chartres se vai bem além dessas proporções.
Eram comuns as estátuas-colunas, pois a ausência de movimento dava à figura uma verticalidade que fazia dela quase um prolongamento do pedestal, tornando-se ela mesma como que uma coluna. Essas figuras apresentam os cabelos e os fios das barbas escorridos, quase sem ondulação, para acentuar a falta de movimento e a estabilidade. Também as vestes não apresentam dobras profundas e apenas caem ao longo do corpo da estátua. São dobras rasas, quase que paralelas, e quase estilizadas.


O gótico radiante e o aristotélico-tomismo

No período radiante, durante o século XIII, atinge-se o apogeu do estilo gótico. A escultura desse período é talvez a mais perfeita que se tenha alcançado na História. É o tempo do apogeu da escolástica, quando São Tomás de Aquino arquitetou a Suma Teológica harmonizando a filosofia aristotélica e o cristianismo. Para Aristóteles, os seres que vemos ao redor de nós possuem duas causas intrínsecas: a causa material e a causa formal.
A causa material é aquilo de que as coisas são feitas, enquanto a causa formal é aquilo que faz da coisa o que ela é. Por isso, matéria e forma substancial deveriam se refletir na escultura. Ao contrário pois do platonismo, a filosofia aristotélica aceitava a matéria. Para o cristianismo isso é absolutamente certo, pois foi Deus quem criou todas as coisas, e o Criador, ademais de afirmar que cada coisa criada era boa, ao contemplar a sua obra criativa, contemplando tudo o que fizera, disse que era "valde bona", isto é, muito boa.
A recusa em aceitar a matéria como boa era típica tese gnóstica, que a Igreja condenara. O próprio Filho de Deus se encarnou e instituiu sacramentos sempre utilizando matéria, demonstrando assim que a matéria é boa.
Ao triunfo da filosofia aristotélico-tomista corresponderia a realização de esculturas em que não se buscava representar apenas a idéia de algo, mas o ser real concreto, com matéria e forma. Esse foi o tempo do gótico radiante, do qual são obras típicas as catedrais de Reims, boa parte de Notre Dame de Paris e de Estrasburgo.
As esculturas desse período atingem grande perfeição e grande equilíbrio. Elas não visam a representar o universal. Elas buscam figurar também o indivíduo, sem esquecer o universal. Por isso, elas não são mais figuras ideais do rei, do cavaleiro, do bispo, mas retratam o Rei São Luís, o Bispo Maurice de Sully, o cavaleiro tal, o Abade Suger. Elas não são puros retratos e nem puras idealizações simbólicas de um conceito universal, mas preocupam-se em esculpir um indivíduo concreto sem menosprezar o que ele era.
Realizando a figuração real de corpos, a estatuária radiante não recusava representar as emoções e o movimento. As figuras fazem gestos, se voltam, não são mais estáticas. As suas vestes se movimentam também, dando ocasião de representá-las com dobras profundas e majestosas, ou então leves e delicadas. As estátuas desse período revelam emoções, mas sempre emoções equilibradas, sem excessos. Elas jamais gargalham. Sorriem. Exemplo típico disso são os magníficos anjos do sorriso que se podem contemplar na Anunciação de Reims ou na apresentação de Jesus no Templo.
Pela primeira vez na História da arte se teve a idéia de representar uma figura sorridente. Os anjos do sorriso de Reims superam tudo o que se havia feito até então em matéria de escultura. Outras obras primas dessa época são a Virgem dourada de Amiens, a serva da apresentação no Templo de Reims e a inigualável escultura do Beau Dieu de Amiens, ainda com alguns traços do gótico primitivo em seu rosto.
Tanto se fala - e com razão, se se atenta apenas para a beleza material – da perfeição das esculturas helênicas. Nelas, porém, jamais se vê um rosto sorridente. Normalmente as esculturas clássicas gregas são de rosto quase inexpressivo. Apenas nas figurinhas de Tanagra se pode encontrar a representação do gracioso.
No gótico radiante, pelo contrário, a felicidade da Idade Média, fruto da paz de alma, sorri nos anjos de Reims.


O gótico flamejante e o Nominalismo

No século XIII a escolástica decai e o nominalismo de Guilherme de Ockham – negador de todo universal e defensor da tese de que só existe o indivíduo – introduz o experimentalismo na ciência, o individualismo na sociedade, e prepara com isso o livre exame luterano e todo o cientificismo moderno. Ockham foi um dos responsáveis pela destruição da Cristandade.
Também na arte, como não podia deixar de ser, o nominalismo ockhamista produziu efeitos péssimos. O estilo que corresponde às teses ockhamistas é os góticos flamejantes ou góticos da decadência, que vigorou nos séculos XIV e XV. Se só existe o indivíduo, e se a matéria é a causa da individuação, tinha-se que destacar o corpo e não a alma, a matéria e não o espírito.
O individualismo nominalista tem como resultado o triunfo do retrato na escultura. Já não se fizeram mais representações de conceitos universais, nem isolados, nem "encarnados" em indivíduos concretos. Faziam-se retratos o quanto mais realistas possível. Se a pessoa a ser representada tinha rugas, na estátua tinham que figurar as suas rugas. Se seu queixo era exageradamente pontudo, o escultor primava em fazê-lo tal qual era. Assim, apareceram retratos brutais ou ridículos. O mercantilismo e o desenvolvimento do comércio e da urbanização deram grande progresso político e econômico para a burguesia, assim como favoreceram o absolu- tismo e o crescimento do papel do Estado.
Isso tudo, junto com o individualismo nominalista, impulsionaram a vaidade. Pessoas ricas, nobres ou burgueses, quando faziam doação de dinheiro para a construção de um altar em uma igreja, exigiam serem retratados, "piedosa" e um tanto vaidosamente ajoelhados aos pés dos altares que haviam financiado. A preocu- pação com o real não recuou nem na representação do prosaico e até do obsceno.
O flamejante se caracteriza pelo triunfo da curva e da contra curva, que vai produzir linhas sinuosas que parecem as de labaredas. A contra curva é introduzida nas ogivas, nos arcos, e reina nas esculturas. Isto vai se casar com a preocupação absoluta de representação do real, e para eles o real era o corpo: a curva permitia a representação fiel dos movimentos dos corpos e dos rostos.
A estátua flamejante é sempre extremamente emotiva, e suas emoções são sempre violentas: ou pranto ou gargalhada, ou terror ou prazer. Os rostos flamejantes já não têm paz. O gosto pela curva e pela contra curva faz os escultores se preocuparem em esculpir figuras com cabeleiras e barbas enormes e caracolantes. O Moisés de Claus Sluter no poço da Abadia de Champmoll em Dijon é exemplo típico disso.
O drapejamento também passa a ser riquíssimo. E, para que as roupagens tenham curvas e contra curvas, elas são esculpidas como se estivessem agitadas por um vento impetuoso. Ao mesmo tempo que se agitam, riem ou choram, as esculturas flamejantes perdem estatura. O módulo flamejante diminui. As esculturas, em geral, passam a ter tamanho menor. Normalmente prefere-se esculpir cenas e não mais pessoas isoladas. Exceção são os retratos de doadores, dos quais já falamos, e cuja "piedade" exigia figuras, se possível, em tamanho natural.
O caráter violentamente emotivo da escul- tura flamejante surge claramente nas figuras sepulcrais. O século XIV viu a Europa ser atingi- da por uma das mais terríveis epidemias que houve na História: a peste negra. Esse flagelo dizimou a população européia no longo período em que grassou pelo continente. Calcula-se que tenha morrido mais da metade da população. As mortes eram bruscas e a enfermidade durava pouco. Foi esse pânico que suscitou toda uma série de expressões artísticas. Na música, surgiram as canções terríveis, como os cantos da Sibila e as danças da morte. A conhecida seqüência Dies Irae é desse tempo.
Na escultura, desenvolveu-se uma arte tumular de caráter mórbido, na qual os mortos eram retratados em estado de decomposição, devorados pelos vermes. Eram figuras desesperadas ante o mistério da morte. Como eram diversas as figuras tumulares na época do gótico primitivo e do radiante! No início da arte gótica e em seu apogeu, as figuras postas jazentes sobre os túmulos - os gisants – revelavam uma grande serenidade em sua tristeza calma.
Com efeito, ante a morte a atitude equilibrada não consiste em estóica indiferença, nem em desespero. A morte é contrária à nossa natureza e a ela repugna. É impossível não encará-la como trágica. Mas, por outro lado, a redenção de Cristo nos salvou da morte eterna. Por isso, os gisants das primeiras fases do gótico eram tristes com esperança. E a esperança da vida eterna punha nas figuras esculpidas sobre os túmulos uma triste, mas serena paz.
Os gisants do flamejante são desesperados. Esse desespero era resultante da perda da Fé, já que o nominalismo, no fundo, era materialista. Assim, se passou da beleza sublime obtida na arte como reflexo da Fé e da sabedoria escolástica para o desespero resultante do materialismo. Quando se busca antes de tudo o Reino de Deus e sua justiça, tudo se alcança por acréscimo. Até mesmo a beleza artística. É o que comprova a escultura na Idade Média, um dos elevados cumes da arte na História.

Origem do Termo Gótico

Segundo a versão mais difundida, o termo "gótico" deriva de Godos, o povo germânico que habitava a Escandinávia. Porém, em sua obra O Mistério das Catedrais, Fulcanelli nos apresenta uma outra versão. A palavra "gótico" seria uma deformação fonética de Argoth (ou Art Goth), uma linguagem restrita utilizada somente por Iniciados em Ocultismo. Embora historicamente essa versão seja incoerente, é uma visão interessante de um grande alquimista.
Confira o trecho do livro que disserta sobre essa possibilidade:


O Mistério das Catedrais – Cap. III
                                                                                                                                 
Alguns pretenderam erradamente que provinha dos Godos, antigo povo da Germania; outros julgaram que se chamava assim a esta forma de arte, cujas originalidade e extrema singularidade provocam escândalo nos séculos XVII e XVIII, por zombaria, atribuindo-lhe o sentido de bárbaro: tal é a opinião da Escola Clássica, imbuída dos princípios decadentes do Renascimento.
A verdade, que sai da boca do povo, no entanto, manteve e conservou a expressão Arte Gótica, apesar dos esforços da Academia para substituí-la por Arte Ogival. Há ai uma razão obscura que deveria obrigar a refletir os nossos lingüistas, sempre à espreita das etimologias. Qual a razão por que tão poucos lexicólogos acertaram? Simplesmente porque a explicação deve ser antes procurada na origem cabalística da palavra, mais do que na sua raiz literal.       
Alguns autores perspicazes e menos superficiais, espantados pela semelhança que existe entre gótico e goético pensaram que devia haver uma estreita relação entre a arte gótica e a arte goética ou mágica.
Para nós, arte gótica é apenas uma deformação ortográfica da palavra argótica cuja homofonia é perfeita, de acordo com a lei fonética que rege, em todas as línguas, sem ter em conta a ortografia, a cabala tradicional. A catedral é uma obra de art goth ou de argot. Ora, os dicionários definem o argot como sendo uma linguagem particular a todos os indivíduos que tem interesse em comunicar os seus pensamentos sem serem compreendidos pelos os que o rodeiam. É, pois, uma cabala falada. Os argotiers, os que utilizam essa linguagem, são descendentes herméticos dos argo-nautas, que viajavam no navio Argo, falavam a língua argótica – a nossa língua verde – navegando em direção as margens afortunadas de Colcos para conquistarem o famoso Tosão de Ouro. Ainda hoje se diz de um homem inteligente mas também muito astuto: "ele sabe tudo, entende o argot". Todos os Iniciados se exprimiam em argot, tanto os vagabundos da Corte dos Milagres – com o poeta Villon à cabeça – como os Frimasons ou franco-mações da Idade Média, hospedeiros do bom Deus, que edificaram as obras-primas góticas que hoje admiramos. Eles próprios, estes Nautas construtores, conheciam a rota do Jardim da Hespérides...
Ainda nos nossos dias os humildes, os miseráveis, os desprezados, os insubmissos, ávidos de liberdade e de independência, os proscritos, os errantes e os nômades falam argot, esse dialeto maldito, banido da alta sociedade, dos nobres que o são tão pouco, dos burgueses satisfeitos e bem pensantes, espojados no arminho da sua ignorância e da sua presunção. O argot permanece a linguagem de uma minoria de indivíduos vivendo à margem das leis estabelecidas, das convenções, dos hábitos, do protocolo, aos quais se aplica o epíteto de vadios, ou seja, de videntes e, mais expressivo ainda, de Filhos ou Descendentes do Sol. A arte gótica é, com efeito, a art got ou cot, a arte da Luz ou do Espírito.
Pensar-se-á que são apenas simples jogos de palavras. E nós concordamos de boa vontade. O essencial é que guiem a nossa fé para uma certeza, para a verdade positiva e científica, chave do mistério religioso, e que não a mantenham errante no labirinto caprichoso da imaginação. Aqui em baixo não existe acaso, nem coincidência, nem relação fortuita; tudo está previsto, ordenado, regulado e não nos pertence modificar a nosso bel-prazer a vontade imperscrutável do Destino. Se o sentido usual das palavras nos não permite qualquer descoberta capaz de nos elevar, de nos instruir, de nos aproximar de Criador, o vocabulário torna-se inútil. O verbo, que assegura ao homem a incontestável superioridade, a soberania que ele possui sobre tudo o que vive, perde a sua nobreza, a sua grandeza, a sua beleza e não é mais do que uma aflitiva vaidade. Ora, a língua, instrumento, do espírito, vive por ela própria, embora não seja mais do que o reflexo da Idéia universal. Nada inventamos, nada criamos. Tudo existe em tudo. O nosso microcosmos é apenas uma partícula ínfima, animada, pensante, mais ou menos imperfeita, do macrocosmos. O que nós julgamos descobrir apenas pelo esforço da nossa inteligência existe já em qualquer parte. É a fé que nos faz pressentir o que existe; é a revelação que nos dá a prova absoluta. Muitas vezes passamos ao lado do fenômeno, até mesmo do milagre, sem dar por ele, cegos e surdos. Quantas maravilhas, quantas coisas insuspeitadas descobriríamos se soubéssemos dissecar as palavras, quebrar-lhes a casca e libertar a o espírito, divina luz que eles encerram! Jesus exprimia-se apenas por parábolas; poderemos nos negar a verdade que elas ensinam? E, na conversação corrente, não serão os equívocos, os pouco mais ou menos, os trocadilhos ou assonâncias que caracterizam as pessoas de espírito, felizes por escaparem à tirania da letra e mostrando-se, à sua maneira, cabalistas sem o saberem?
Acrescentemos, por fim, que o argot é uma das forças derivadas da Língua dos Pássaros, mãe e decana de todas as outras, a língua dos filósofos e dos diplomatas. É o conhecimento dela que Jesus revela aos seus apóstolos, enviando-lhes o seu espírito, o Espírito Santo.
É ela que ensina o mistério das coisas e desvenda as verdades mais recônditas. Os antigos Incas chamavam-na Língua da Corte porque era familiar aos diplomatas, a quem fornecia a chave de uma dupla ciência: a ciência sagrada e a ciência profana. Na Idade Média, qualificavam-na antes da edificação da torre de Babel, causa da perversão e, para a maioria, do esquecimento total desse idioma sagrado. Hoje, fora do argot, encontramos as suas características nalgumas línguas locais como o picardo, o provençal, etc. e no dialeto dos ciganos.
A mitologia pretende que o célebre adivinho Tirésias tenha possuído perfeito conhecimento da Língua dos Pássaros, que Minerva lhe teria ensinado, como deusa da Sabedoria. Ele partilhava-a, diz-se, com Tales de Mileto, Melampus e Apolônio de Tiana, personagens fictícios cujos nomes falam eloqüentemente na ciência que nos ocupa e bastante claramente para que tenhamos necessidade de os analisar nestas páginas.

Cultura Dos Godos



Originários das regiões meridionais da Escandinávia, os Godos eram um povo germânico que se distinguia pela fidelidade ao seu rei e comandantes, também por usar espadas pequenas e escudos redondos. Desta forma, deixaram a região do rio Vístula (atual Polônia) em meados do século II, e alcançaram o Mar Negro.
Com a presença goda, os outros povos germânicos passaram a pressionar o Império Romano de Marco Aurélio através do rio Danúbio. No século seguinte, foram várias as incursões, ataques e saques as províncias de Anatólia e toda a península balcânica. A Costa Asiática e o Templo de Éfeso foram vítimas da fúria dos Godos. Já sob o reinado de Aureliano (270 - 275), Atenas foi invadida e seguiram-se a tomada de Rodes e Creta. Os romanos foram expulsos de Dácia, e os Godos se instalaram definitivamente na região do Danúbio. Assim de acordo com a região ocupada, os Godos foram denominados também de Ostrogodos e Visigodos. A partir deste momento, a cultura e política do Godos passaram a influenciar gradativamente à Europa através do Império Romano.


Ostrogodos

O reino ostrogodo, que se estendia do mar Negro até o Báltico, alcançou o apogeu com Ermanarico. Porém, por volta do ano 370 foram dominados pelos Hunos. Em 455, o império huno entrou em colapso com a morte do líder Átila. Os ostrogodos invadiram o Danúbio central e seguiram para a Itália, onde o imperador Rômulo Augústulo havia sido derrotado (476) por Odoacro, chefe dos Hérulos. O rei ostrogodo Teodorico I - o Grande, derrotou Odoacro (493) e governou a Itália até a sua morte em 526.
Teodorico foi um governante hábil, homem culto, educado na corte de Constantinopla, que soube conservar o equilíbrio entre as instituições imperiais e as tradições bárbaras. Conseguiu a simpatia da aristocracia romana e do povo, que assistia satisfeito à realização de obras públicas para a reconstrução e modernização de Roma. Ao que parece, Teodorico alimentava o projeto de fundar um império godo que impusesse seu domínio sobre o resto do mundo bárbaro. Para isso, manteve contato com outras tribos godas e estabeleceu vínculos familiares com os francos, os vândalos e os burgúndios. Sua morte criou um intrincado problema de sucessão, fato de que se valeu o imperador bizantino Justiniano para intervir na Itália. O exército romano oriental, sob o comando de Belisário, derrotou completamente os ostrogodos, dirigidos por seu novo rei Totila, cujo nome original era Baduila. Os sobreviventes se dispersaram ou foram reduzidos à escravidão.


Visigodos

O povo valente, possível significado do nome visigodos, conquistou no século III a Dácia, província romana situada na Europa centro-oriental. No século IV, ante a ameaça dos hunos, o imperador Valente concedeu refúgio aos visigodos ao sul do Danúbio, mas a arbitrariedade dos funcionários romanos os levou à revolta. Penetraram nos Balcãs e, em 378, esmagaram o exército do imperador Valente nas proximidades da cidade de Adrianópolis. Quatro anos depois, o imperador Teodósio I o Grande conseguiu estabelecê-los nos confins da Mésia, província situada ao norte da península balcânica. Tornou-os federados do império e deu-lhes posição proeminente na defesa. Os visigodos prestaram uma ajuda eficaz a Roma até 395, quando começaram a mudar-se para oeste. Em 401, chefiados por Alarico I, que rompera com os romanos, entraram na Itália e invadiram a planície do Pó, mas foram repelidos. Em 408 atacaram pela segunda vez e chegaram às portas de Roma, que foi tomada e saqueada em 410.
Nos anos seguintes, o rei Ataulfo estabeleceu-se com seu povo no sul da Gália e na Hispânia e, em 418, firmou com o imperador Constâncio um tratado pelo qual os visigodos se fixavam como federados na província de Aquitania Secunda, na Gália. A monarquia visigoda consolidou-se com Teodorico I, que enfrentou os hunos de Átila na batalha dos Campos Catalâunicos. Em 475, Eurico declarou-se monarca independente do reino visigodo de Tolosa (Toulouse), que incluía a maior parte das Gálias e a Espanha. Seu reinado foi extremamente benéfico para o povo visigodo: além da obra política e militar, Eurico cumpriu uma monumental tarefa legislativa ao reunir as leis dos visigodos, pela primeira vez, no Código de Eurico, conservado num palimpsesto em Paris. Seu filho Alarico II codificou, em 506, o direito de seus súditos romanos, na Lex Romana Visigothorum, mas carecia dos dotes políticos do pai e perdeu quase todos os domínios da Gália em 507, quando foi derrotado e morto pelos francos de Clóvis, na batalha de Vouillé, perto de Poitiers. Desmoronou então o reino de Tolosa e os visigodos foram obrigados a transferir-se para Espanha.
O reino visigodo na Espanha esteve inicialmente sob o domínio dos ostrogodos da Itália, mas logo tornou-se independente. Para conquistar o domínio da península ibérica, os visigodos enfrentaram suevos, alanos e vândalos, povos bárbaros que haviam ocupado o país antes de sua chegada. A unificação quase se concretizou durante o reinado de Leovigildo, mas ficou comprometida pelo problema religioso: os visigodos professavam o arianismo e os hispano-romanos eram católicos. O próprio filho de Leovigildo, Hermenegildo, chegou a sublevar-se contra o pai depois de converter-se à religião católica. Mas esse obstáculo para a fusão com os hispano-romanos se resolveu em 589, ano em que o rei Recaredo proclamou o catolicismo, religião oficial da Espanha visigótica. A monarquia visigoda foi destruída em 711 pela invasão muçulmana procedente do norte da África.
Os visigodos, mais civilizados que outras tribos germânicas em virtude de seu longo contato com Roma, adotaram a arte do povo bizantino como o arco de ferradura e a planta cruciforme das igrejas, e realizaram um importante trabalho de compilação cultural e jurídica. Figuras como santo Isidoro de Sevilha, ou obras jurídicas como o Código de Eurico, a Lex Romana Visigothorum e o Liber Judiciorum, código visigótico que forneceu as bases da estrutura jurídica medieval na Espanha, expressam o grau de desenvolvimento cultural que o reino visigodo alcançou.


Do "Gótico" dos godos ao adjetivo "Gótico"

Apesar dos godos terem sido extintos no começo do século VIII, seus feitos e conquistas deixaram marcas permanentes nos povos italianos. Principalmente a Queda do Império, com tantas construções greco-romanas destruídas, trouxe um trauma que foi passado de geração em geração.
Desse modo, na época do Renascimento, no século XVI, o termo godo era sinônimo de "inculto destruidor da arte clássica". E esse conceito pejorativo, passa a ser usado para classificar a arte cristã produzida entre o século XII e XVI, período em que a Igreja absorvia a estética pré-cristã da região onde se instalava, chegando até mesmo a absorver certas características pagãs.
Assim, analogicamente, esse estilo arquitetônico predominante nesses séculos, cheio de ogivas, vitrais e gárgulas, passou a ser considerado pelos italianos, o "povo bárbaro" que "invade" o "povo clássico-cristão", tornando impura a arquitetura cristã da época.
A grande intenção era vulgarizar todo o estilo, mas pelo que foi visto nos séculos posteriores, o termo "gótico" acabou formando uma coesão do obscurantismo medieval, fincando deste modo, raízes permanentes na Europa.